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Ciência empreendedorismo e sustentabilidade o Brasil está pronto para suas empresas mais promissoras

 

Empresas sustentáveis intensivas em ciência são organizações que têm como principal diferencial competitivo o uso intensivo de conhecimento científico e tecnológico para criar produtos, processos ou serviços inovadores que buscam gerar valor combinado – econômico, social e ambiental. Diferentemente do empreendedorismo tradicional, são negócios normalmente fundados por cientistas empreendedores e nascem como startups dentro de universidades ou institutos de pesquisa. As também chamadas empresas verdes intensivas em conhecimento (EVIC) buscam criar soluções para desafios socioambientais complexos, fomentando um desenvolvimento econômico e social mais equilibrado e sustentável para o país, de acordo com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estabelecidos pela ONU. Veja aqui alguns exemplos de empresas brasileiras deste tipo.

No entanto, o Brasil ainda não oferece um ambiente de apoio adequado para a consolidação e expansão destas empresas, que não contam com linhas de financiamento ou políticas públicas específicas de fomento. Ampla análise desta questão está em tese de doutorado defendida recentemente pela pesquisadora Gisela Consolmagno, no Programa de Pós-Graduação em Administração da Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp, com orientação do Prof. Gustavo Salati Moraes.

O trabalho, intitulado A influência do ecossistema empreendedor na criação de valor combinado no empreendedorismo verde intensivo em conhecimento, foi premiado pela Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração (ANPAD), escrito originalmente em inglês e está disponível para consulta neste link. Resultados da pesquisa também foram divulgados recentemente na Revista Científica Sustainable Development – veja aqui.

Consolmagno coletou dados primários por meio de um survey junto a 245 empreendedores brasileiros participantes do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), da FAPESP – incluindo tanto empreendedores de negócios verdes intensivos em conhecimento quanto de empresas tradicionais. Para analisar esses dados, a pesquisadora utilizou uma combinação complementar de métodos simétricos e assimétricos: a modelagem de equações estruturais por mínimos quadrados parciais (PLS-SEM), que permite examinar relações diretas entre variáveis em grandes amostras; e a análise qualitativa comparativa fuzzy-set (fsQCA), voltada à identificação de múltiplas combinações causais que levam a altos níveis de criação de valor combinado (econômico, social e ambiental). O PIPE, criado há mais de 20 anos pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), é reconhecido como a maior iniciativa nacional de apoio à pesquisa e inovação tecnológica em pequenas e médias empresas, sendo considerado um pilar para consolidar o estado em um polo internacional de startups e empresas de base científica e tecnológica.

A pesquisa investigou quais elementos do ecossistema empreendedor influenciam a criação de valor combinado (social, econômico e ambiental) no empreendedorismo intensivo em conhecimento, para empresas verdes e não verdes. O ecossistema empreendedor é o contexto econômico, político, social e cultural no qual os empreendedores operam e buscam criar valor. Ele influencia as decisões estratégicas e práticas operacionais dos empreendedores e é formado por elementos como os mercados (interno e externo), capital humano e força de trabalho, acesso à financiamento e políticas públicas, marco regulatório e infraestrutura, universidades, fatores culturais e sociais, etc.

Os resultados indicam que, na análise simétrica, apenas fatores sociais, culturais e educação e treinamento apresentaram impacto positivo significativo para empreendedores verdes – por outro lado, uma análise mais complexa dos dados coletados mostrou que diferentes combinações de vários elementos do ecossistema podem levar a altos níveis de valor combinado por estas empresas. O fato de políticas públicas ou acesso a financiamento não terem aparecido como fatores relevantes na análise simples é preocupante, explica Salati.

“A pesquisa promoveu um avanço na compreensão sobre como os empreendedores sustentáveis intensivos em conhecimento interagem com o ecossistema em que estão inseridos. Os resultados mostram que, apesar do forte discurso sobre sustentabilidade, os elementos do ecossistema que de fato estão influenciando a criação de valor combinado ainda são muito limitados. Isto revela que há um desalinhamento preocupante, mesmo em programas robustos como o PIPE Fapesp. O ambiente institucional brasileiro ainda não está preparado de forma satisfatória para fomentar transições sustentáveis”, alerta o orientador do trabalho.

Segundo ele, os achados da pesquisa têm implicações relevantes para o desenho de políticas públicas, programas de apoio, iniciativas universitárias e ações da sociedade civil. “Estamos enfrentando desafios estruturais em escala global para a sustentabilidade e para promover empresas que integrem inovação e impacto ambiental positivo, entao é importante termos ecossistemas mais responsivos e inclusivos, para que os negócios consigam gerar valor de forma integrada nas dimensões econômica, social e ambiental. ”

Veja abaixo mais detalhes sobre os resultados.

Veja os principais resultados da pesquisa explicados de maneira simplificada:

Abordagem Simétrica (método PLS-SEM):

Quando se considera a amostra total de empreendedores (verdes e tradicionais misturados), apenas os fatores sociais (como a percepção do empreendedorismo na sociedade) e culturais (como a cultura local apoia o empreendedorismo) apresentaram impacto positivo relevante na criação de valor combinado.

Outros fatores frequentemente considerados importantes - como acesso a finanças, políticas do governo, programas de apoio, infraestrutura física e educação/treinamento - não tiveram impacto estatisticamente significativo nessa abordagem.

Ao comparar os dois grupos, observou-se que a influência dos fatores culturais é distinta: para os empreendedores verdes, esses fatores são relevantes; já para os empreendedores tradicionais, apenas os fatores sociais se destacaram. Isso sugere que a cultura local exerce um papel mais determinante no apoio à criação de valor combinado em negócios verdes.

Abordagem Configuracional (método fsQCA):

Esta abordagem revela que a criação de valor combinado é um processo multifatorial. Nenhum fator isolado (como apenas ter acesso a recursos financeiros) é suficiente ou necessário por si só para garantir altos níveis de valor combinado.

Em vez disso, várias combinações de diferentes elementos do ecossistema empreendedor podem levar a resultados expressivos de criação de valor combinado.

Para os empreendedores verdes, a análise identificou três combinações (caminhos) principais que levam a valores combinados significativos. Essas combinações frequentemente incluem:

Uma combinação de acesso a finanças, programas de apoio governamentais, fatores culturais, fatores sociais e educação/treinamento – com destaque para o papel central dos fatores culturais.

Uma combinação de políticas e regulamentação do governo, fatores culturais e fatores sociais – também com fatores culturais como elementos centrais.

Uma combinação de acesso a financiamento, políticas e regulamentação do governo, programas de apoio do governo, acesso à infraestrutura física e educação/treinamento – com destaque para o financiamento e os programas de apoio.

A educação e treinamento aparecem como fatores relevantes em dois dos três caminhos para empreendedores verdes, mas em nenhum caminho para empreendedores tradicionais, destacando sua relevância específica para empresas sustentáveis.

Para os empreendedores tradicionais, foram mapeadas nove combinações possíveis. Fatores sociais e acesso a financiamento surgem como elementos centrais em muitos desses caminhos.

A infraestrutura física também se mostrou mais relevante para esse grupo, aparecendo em seis dos nove caminhos, enquanto entre os verdes foi destacada em apenas um de três.